sábado, 28 de novembro de 2015

Presidenciais ( 2 )




2º texto a ler


Politicamente, o mandato de Cavaco acabou no dia de tomada de posse deste Governo. É ler ou ouvir o discurso.

Acabou o mandato na sua substância.

Cavaco não é um institucionalista. Cavaco é tristemente o melhor exemplo que a nossa história democrática nos ofereceu de quem sempre distinguiu o seu nome próprio – Aníbal Cavaco Silva – do órgão “Presidente da República”. Esta distinção foi sempre feita a benefício do primeiro. Não encontramos, ao longo destes dez anos, um único dos poderes presidenciais consagrados na Constituição (CRP) que tenha sido exercido com o espírito do mesmo, como sendo competência de alguém que não se representa, antes representando a República.

Não vale a pena recordar todas as indignidades a que fomos sujeitos. A história recente de um país parado, indefinidamente, sem o único Governo viável, à conta de uma adesão de Cavaco à campanha da direita e não ao texto constitucional é um epitáfio fiel de um homem de nome Aníbal Cavaco Silva que tudo fez para se sobrepor ao Presidente da República que a CRP exige.

Estamos num tempo novo e desafiante.

O paradigma político-social mudou para sempre com a morte das convergências que de tão tradicionais se pensaram donas da democracia e Cavaco, terminando o seu mandato formalmente, dá-nos a oportunidade de devolver um Presidente da República à República.

Esta última oportunidade não pode ser desperdiçada. Não pode ser decidida pela empatia televisiva de quem faz campanha há um ano em exclusivo na TVI, porque a desigualdade dessa arma deve pesar mais do que a habituação ao rosto.

Não pode ser decidida apenas porque Marcelo - que aprecio pessoalmente – é popular, abandonamo-nos à preguiça de constatar que o candidato em causa não tem um plano da sua conceção dos poderes presidenciais, não é claro e direto nas respostas, num estilo de rede simpática apanha-tudo, é incerto, é imprevisível, a sua história política prova que não sabemos mesmo com quem contar numa segunda-feira e com quem contar numa sexta-feira, embora estejamos sempre a falar mesma pessoa.

De resto, é isso que faz de Marcelo um homem divertido, mas não um candidato.

Sendo mulher, e feminista, tenho por importante a representação feminina nos cargos políticos. Nunca houve uma Presidente da República. É um facto. Mas nunca me bastaria a constatação de ver uma militante do meu Partido- no caso, Maria de Belém – para desatar a correr para o voto em nome das mulheres ao poder. Porque não é esta a mulher que eu quero a fazer história.

Direi mesmo que até por ser mulher, a minha adesão à candidatura de Sampaio da Nóvoa é reforçada perante Maria de Belém. Basta recordar-me, sobretudo na semana em que se discutiu, quase dez anos depois, o absurdo de mulheres que não tenham a tutela de um homem serem excluídas do acesso à procriação medicamente assistida (sexismo e homofobia num pacote), que Maria de Belém tutelou esse processo. Sim, em 2006, Maria de Belém tutelou o processo que informou mulheres solteiras, viúvas, lésbicas, casais de lésbicas disto: o vosso útero pertence a um homem.

É verdade que com a disciplina de voto votou favoravelmente o casamento entre pessoas do mesmo sexo, mas ficou clara a sua discordância na declaração de voto que apresentou. Pertencia ao grupo que defendia um outro caminho.

Estes dois exemplos não relevam apenas das matérias em causa. Relevam para nos apercebermos que Maria de Belém, sendo mulher, não comporta em si o desígnio mais forte que essa condição na Presidência mereceria: um conceito amplo, sem pó, sem adversativas da igualdade.

É por isto, por também não encontrar em Maria de Belém uma vontade fundacional de ser candidata, nem um guia do que entende ser o exercício dos poderes presidenciais que, por mim, Belém não irá para Belém.

Sampaio da Nóvoa não esperou. Nada tem contra os Partidos, antes pelo contrário, mas dispenso a retórica que lhe vejo ser atirada vinda de um bafiento conceito de monopólio dos Partidos ou da pertença a um Partido, como fator de superioridade para se atuar politicamente.

Sampaio da Nóvoa tem uma visão cosmopolita do mundo, tem como positivas as diferenças de identidade, de modelos de família, de modelos de parentalidade, rejeita a abominável tarefa estatual que desgraçou o século passado, essa de padronizar comportamentos.

Finalmente, Sampaio da Nóvoa apresentou uma Carta de Princípios que corresponde à mais correta interpretação que já li do que deve ser o exercício dos poderes presidenciais. Já o expliquei aqui .

É ouvir, é ler, é estar atento, é ter memória, é não ceder à preguiça e fazer de Sampaio da Nóvoa o grande candidato da esquerda.





(ambos os textos são de Isabel Moreira -  Expresso )

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